quarta-feira, 3 de outubro de 2012

Os bebés vêm quando eles querem

Foi assim que, há alguns (vários, cinco?) anos, a C. começou uma frase que me acompanha desde então, rematando-a com "e não quando nós queremos". O tempo encarregou-se de me revelar a sabedoria, paciência, e amor que estão contidos nestas palavras.

Ontem, ou era "ontem" quando comecei a escrever este texto, mas acho que já lá vão uns dias, lembrei-me desta frase quando soube da chegada do baby-de-mulata, que ousarei acarinhar e em concordância com este sentir apelidar de meu sobrinho blogosférico (sortudo, é rico em tias em lugares exóticos). A blogosfera é caricata nestas coisas, e gera afectos entre gentes cujos percursos físicos nunca se cruzaram (quem sabe um dia? -- já me aconteceu e a realidade foi uma paixão assolapada, ou quatro, desta que tanto vos estima). Acompanhei com ternura a chegada da manguinha da Inês e a chegada da baby-bear e agora é com expectativa que leio os posts da Filipa à espera de novidades sobre o seu (que já é um bocadinho meu também) rapaz (nem quero pensar quando for a vez da Mariana, só me vai faltar andar aos pinchos -- talvez ande mesmo, que isso do comer e do pinchar tudo vai do começar). Mas divago.

Os bebés vêm quando eles querem e o baby-de-mulata deu um ar da sua graça (consta que tem um ar meio gozão) quando lhe aprouve, não importa as circunstâncias da vida da moça. À minha querida Beijo-de-Mulata sorriu-lhe o filho, e assim lhe disse que finalmente se tinham encontrado. Sentado na sala das enfermeiras, reconheceu-a primeiro e, olhando-a nos olhos, deixou que percebesse que a tinha escolhido. Ele não era o menino que ela tinha imaginado, não era, como ela própria escreve, um menino africano. Sendo um menino que mais ninguém queria, era lourinho, simpático. Quando ele decidiu, o milagre aconteceu, e aquele sorriso foi o início do amor à primeira vista de que a rapariga do mato nos veio falar. Sempre tão ciosa da sua intimidade, foi vencida pela imensa ternura que invade o coração de uma mãe. Foi-se o recato, foi-se a discrição, foi-se a relutância em falar de si. Como todas as mães, não conseguiu conter o seu entusiasmo. Tal como eu não consegui conter o meu com a chegada do biscuit, coisa que até redundou em foto do petiz publicada aqui no blog (se Monsieur Bolacha sabe divorcia-se-me no momento).

Esta escolha, que os filhos fazem e à qual nós nos subjugamos em absoluto, fez-me também lembrar de um episódio que vivi no pós parto, na solidão do quarto de hospital, ia já alta a noite. Como não fiz qualquer menção de esconder, saber que ia ter um filho, um menino, foi uma desilusão para mim. Eu queria uma menina, eu queria outra menina, e não me via mãe de um menino. As pilitas são feias, os testículos são feios, os meninos são piratas e cowboys, são buliçosos, as roupas (aqui) são feias e não há muita escolha... tudo razões absurdas mas perfeitamente válidas para quem as chama de suas.

Ora quando o meu filho nasceu, eu não tive uma descarga emocional como a que tive com a minha filha. Quando ela começou a chorar nos meus braços também eu chorei e ri ao mesmo tempo, numa ternura desenfreada. Com o Max não. Foi como pegar num desconhecido, feioso, enrugado, sujito. Não houve um clique. Vi-o ser levado para ser examinado e segui tudo atentamente. Mas de fora, como se não estivesse a acontecer com o meu menino. Isso veio mais tarde, na solidão do quarto de hospital, ia já alta a noite. Sozinhos, sem buliço, o meu filho escolheu-me. Não sorriu, naturalmente, tinha horas, mas sei que naquele momento me disse que era tão meu quanto eu era dele. E foi assim que veio o meu menino, quando ele quis. E na solidão e paz do quarto de hospital, ia já alta a noite, eu cedi e apaixonei-me. E dei por mim a cantar-lhe Jobim (e Vinicius):

E ele, o Max, o meu filho, gostou.

10 comentários:

  1. As minhas hormonas não aguentam ler estes textos! :)
    Estou ansiosa por viver esse amor enterno que descreves. Estou ansiosa por ter o meu pequeno rebento no colo. (já) Só faltam 3 meses.

    Beijinhos grandes Bolacha!

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    1. As tuas hormonas andam loucas e depois vão pirar de todo. Saboreia e aproveita a desculpa para te saltar a tampa (do frasco da gritaria, do frasco da gargalhada, do frasco das lágrimas, o que te apetecer). Saboreia também estes próximos três meses, depois já ninguém te liga e é só atenção para o teu baby.
      Beijoquinhas e mini-beijoquinhas!

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  2. Há muito tempo atrás, também eu cantei para o meu menino.
    Lindo o teu texto!

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  3. Lindo texto Bolachinha, cheio daquela sensibilidade que só uma mãe pode ter... Realmente é importante algumas mães saberem que o amor nem sempre nasce com a cria, mas que se lhe desprende tempo depois... Ou então é a oxitocina que demora a descarregar, mas isso não interessa nada para o caso...
    Mas sabes, ultimamente ando a pensar nisso de ser mãe de uma cria de 2 patas... Mas tal como a mulata, quero adoptar (e @ meu/minha menin@) nem precisa de ser bebé, até pode já saber andar e dizer mãe, não sou exigente, basta-me que saiba que ele/a precisa de mim e que eu preciso dele/a, mas tal como a mulata o meus timings são sempre os errados e tenho medo que se mantenham assim por demasiado tempo, até ser demasiado tarde... Mas se tu disses que os filhos vêm quando querem, fico muito mais descansada! Para já vou treiando com os meus filhos de 4 patas, e esses também vieram quando quiseram... Não procurei nenhum deles...

    Beijo da cidade das acácias.

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    1. Miss,
      Percebeste que a outra tia no lugar exótico és tu, não percebeste?
      Até os gatuchos te escolheram, huh?
      Um filho é, como disse a amiga da BdM, um projecto de vida, que tem de ser muito pensado. Primeiro tens outro rebento que tens de pôr cá fora, depois pensas no resto. Até lá, miaus!
      Um sorriso ternurento e apertado!

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  4. Quando for o meu, vai ter tias blogosféricas maravilhosas.

    Beijo gigante *

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    1. O teu menino vai ser a riqueza das titis! Eu lá estarei, a crochetar chapéuzinhos com orelhas (não sei fazer mais nada!), a mimá-lo, e a encher-te de unwanted advice. Mas sempre bem intencionado!!!!
      Um xi ainda mais gigante!

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  5. Lindo! O teu texto deixou-me com uma lagrimazinha no canto do olho...

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  6. Na altura tentei, sem sucesso, postar o meu comentário por 2 vezes. A ver se desta vai:

    - que post tão lindo e doce!! :)

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