quarta-feira, 27 de julho de 2011

Sabes que te americanizaste um little bit quando... #6: Desavergonhada, deselegante, ou poupadinha, ainda não encontrei o adjectivo adequado

(a propósito do post anterior)

Quando sobra muita comida no restaurante (às vezes finório) e pedes ao empregado uma caixa para a levar para casa. Esta prática é o pão com manteiga dos restaurantes americanos: se sobra (muita) comida, o cliente leva-a para casa.
País de gente prática e pouco dada a vergonhas absurdas (quer-se-dizer... vamos ignorar esta minha observação, que aqui está mais por estilo do que por outra coisa, anuir, e passar à frente), devotos da eficiência e do least effort para o greatest outcome (o que redunda quase no mesmo, ou não seja a definição de eficiência aquela utilização de recursos óptima que maximiza a produção -- perdoem-me a escorregadela económica), por lá se reconhece o desperdício como o décimo primeiro pecado mortal, daí que se tenham criado coping mechanisms que chegam a, pelo menos neste caso, mudar a mentalidade de um povo que, ainda que o negue a torto e a direito, vê na Velha Europa o expoente máximo da elegância e saber estar (um dia venho aqui escrever sobre o que é o eating European style ou continental style -- por favor não me estraguem a brincadeira com uma pesquisa temática).
Ora lá pelas Américas, as do Norte, favor não confundir com as do Sul, não é um bom empregado de mesa (e portanto lá se vai parte da gorjeta, que varia entre uns insultuosos 10% do total da conta sem imposto e uns mais normais 20%, ainda que este limite superior não exista na presença de uma carteira mais recheada e um serviço exemplar) aquele que, no final da refeição, não pergunta "would you like a box"?
Desejaria uma caixa? e está tudo dito. Não é embaraçoso levar comida para casa, é eficiente, é mais limpo, e é até um acto de lisonjearia para com o chef, pois que se sobrou não era porque a comida estava indigna de tão fino palato e aliás até se gostaria de comer mais um bocadinho amanhã ou quando melhor aprouver ao patron (adoro que por lá os clientes sejam chamados assim, termo que de modo algum se traduz como "patrão").
Cá é feio, é "de pobre" pedir para levar a comida embora. Caminhar restaurante afora com o saquinho "dos restos", até este termo é feio, é quase como fazer uma caminhada dos tristes, cabeça levemente inclinada para baixo, olhar no chão sem fitar outro qualquer comensal, como se o saco tirasse aprumo à espinha ou então fosse uma letra escarlate, um "P" maiúsculo e bem gordo marcando uma bolsa mais às moscas e indigna de partilhar o pão com os demais.
Reconheço aqui (mais uma vez) que me divertem as diferenças culturais e o quão rápida sou a adoptar as que combinam com a cor dos meus olhos. Todavia fiel a este sentimento tão português que é a oferta de explicações para qualquer soluço que me engasgue, sou igualmente afoita a explicar que sou emigrante e que por isso, entre o "he has a mala!" ou o "come here ou dou-te uma bofetada" que mais dia menos dia hão-de sair da minha boca, por ora vou dizendo "lá na América faz-se assim".

6 comentários:

  1. olá!
    isso tb não tem a ver com as quantidades/ porções servidas?
    é que cá não estou a ver assim tantos restaurantes em que sobre o suficiente para levar para casa. tirando os restaurantes chineses, e aí faço, sim, na boa.
    e cm sabes a questão da quantidade servida / porções tb é cultural. nos eua, imagino, devem ser muito maiores?

    Essa questão de tudo o que é europeu ser "fino", cá tb é um bocado assim mas ao contrário. quem vai aos "states" ui que loucura! que finesse lol
    seja viajar, comprar roupa, etc

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  2. Aloucura,
    Tens razão quando dizes que as coisas americanas nos parecem finas -- raramente me lembro disso, acho a maioria dos EUA tão parola e desinteressante... o que a vai safando (aos meus olhos) são as casas de fashion europeias ou de inspiração europeia.
    A questão das porções não é linear e, como cá, depende muito do restaurante (aliás eu raramente consigo acabar um prato diário normal). O restaurante a que fui comer o arroz de pato é o Cunha, no Porto, e pedimos uma dose para três pessoas.
    Um sorriso matinal!

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  3. Por cá também já se vai fazendo, ainda que a sul seja mais complicado por que as quantidades não deixam muito lugar a que sobre na travessa...

    Estive 3 semanas nos Estados Unidos há uns 3 ou 4 anos, a minha visão da América e dos americanos estava formatada pelos 10 anos que vivi a Sul, na Venezuela, essas 3 semanas deram para criar a minha opinião e sai de lá com duas certezas, os americanos são antes de mais, práticos, com tudo o que de bom e de mau isso tem, a segunda constatação é que ... eu era capaz de viver ali.... mesmo.

    Jorge

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  4. Jorge,
    Será uma coisa nortenha, a de encher os pratos ou travessas até não poder mais? Que questão cultural tão interessante...
    Acredito em ti, os EUA são um país fantástico para se viver e para se criar uma família. Mais, lá existem/tenho oportunidades e valências que desconheço por cá. Mas irrita-me muito a obsessão com o politicamente correcto, com o que é proper. E também me faz falta o mar (eu vivo em sítios muito esquisitos) e a forma como o aproveitamos e vivemos (entenda-se as esplanadas e os cafés, os geladinhos ao fim do dia a ver o pôr do sol...).
    Um sorriso bem português!

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  5. É sem duvida uma coisa nortenha, assim como o é o facto de uma dose dar para dois... cá para baixo não existem meias doses em lado nenhum .... e na maior parte dos sítios a comida até já vem no prato.

    Eu estive em Princeton e foi em Dezembro, a minha visão é um bocado a do campo americano, da costa Este... imagino que haverá muitas Américas num país que é um continente ... a mim também me irrita o politicamente correcto... mas irrita-me lá e cá....

    Jorge

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  6. Jorge,
    Ahhhhhhh! Eu vou pouco ao Sul (infelizmente). Adoro qualquer pretexto para ir a Lisboa e adoro cada momento, e vou normalmente a banhos ao Algarve, mas tenho-me ficado por isso (uma vergonha!).
    Acho que há muitas Américas da mesma forma que há muitos Portugais. São as gentes que fazem os países e por lá há muitas, assim como cá.
    Nunca fui a Princeton, mas deve ser bonito. O Oeste americano não tem rigorosamente nada a ver com a Costa Leste. Vê-se nos carros, nas casas, na pessoas, no modo de falar, no perímetro da cintura...
    Se não fosse a treta da falta de apoio na saúde seria um excelente país para viver. Apesar de nos queixarmos do de cá, o sistema lá é bem pior (para ir ao hospital com a minha filha, que tinha 40.5ºC de febre, e tendo seguro, deixei logo $125 na recepção; nem quero pensar se ela tivesse tido alguma coisa séria...).
    Um sorriso!

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